O Que Diz A Ciência

Hoje estreamos uma nova rúbrica no blog do LeguCon, intitulada “O Que Diz A Ciência”, onde vamos abordar, com uma linguagem mais acessível, os principais resultados e conclusões obtidos em artigos científicos sobre leguminosas. Desde práticas agrícolas até à perspetiva do consumidor, o nosso objetivo é aproximar os Cidadãos à Ciência e promover a partilha de resultados científicos sem terminologias técnicas.

Como primeiro artigo, vamos analisar os “Múltiplos benefícios das leguminosas para a sustentabilidade da agricultura: uma visão geral”, dos autores Fabio Stagnari, Albino Maggio, Angelica Galieni e Michele Pisante. Podem consultar o artigo aqui.

A utilização de leguminosas para uma produção agrícola mais sustentável

As leguminosas são culturas com um papel fundamental na agricultura sustentável. Além de serem uma ótima fonte de proteína vegetal, compatível com os novos padrões alimentares, contribuem também para a redução da emissão de gases de efeito estufa. Os seus benefícios ambientais são também devidos à sua capacidade de fixar azoto atmosférico e de aumentar o teor de matéria orgânica de alta qualidade, o que facilita a circulação de nutrientes no solo e aumenta a retenção de água. Paralelamente, a sua introdução em sistemas de cultivo modernos apresenta benefícios socioeconómicos, nomeadamente, o aumento da diversidade de culturas e a redução da utilização de insumos agrícolas. Pelo disposto, estas culturas têm um papel importante na agricultura de conservação, com a vantagem de poderem ser utilizadas quer como cultura em crescimento quer como aproveitamento do resíduo da cultura.

A produção de leguminosas na Europa e no mundo

Atualmente as tendências de produção de leguminosas de grão são muito variáveis em todo o mundo. Na Europa, a produção de leguminosas está em declínio, mas em outras regiões do mundo, como a Austrália e o Canadá, por exemplo, a produção de leguminosas têm vindo a aumentar nas últimas décadas. Nestes dois países, a agricultura é ainda muito caracterizada pela monocultura, mas tem sido feita uma substituição progressiva das práticas agrícolas, incluindo a diversificação de culturas ou a adoção de práticas de conservação dos solos.

No cenário europeu, as condições climáticas, as cadeias de abastecimento e os mercados não estão adequadamente desenvolvidos para o cultivo deste tipo de culturas. Mais ainda, as leguminosas estão associadas a rendimentos inferiores e a uma maior suscetibilidade a condições de stress biótico e abiótico. Excecionalmente, a soja apresenta um mercado global bem desenvolvido, pela sua importância na alimentação animal, por exemplo.

Nos últimos anos, os aumentos no rendimento de leguminosas por unidade de área foram menores do que aqueles registados para os cereais, por exemplo:

> na soja registou-se um aumento de 86 %, na lentilha de 77 %, no amendoim de 75 %, no grão-de-bico de 70 % (Figura 1);

> enquanto que nos cereais o aumento foi de 104 %.

A integração das leguminosas nos sistemas de cultivo continua assim aquém das necessidades de um sistema agro-alimentar mais sustentável, não apenas devido às escolhas dos agricultores mas também como resultado das políticas agrícolas, que são atualmente insuficientes para fornecer estratégias eficazes de alavancagem para este setor.

Principais impactos das leguminosas-grão em números

Para conservar o carbono e os nutrientes no solo, os investigadores sugerem que se reduza a mobilização do solo e que se façam rotações de culturas. Por outro lado, a utilização de “culturas de cobertura” que permitam deixar os resíduos das culturas à superfície do solo para incorporação posterior é um bom exemplo do tipo de práticas agrícolas sustentáveis. Estes resíduos deixados durante as operações entre culturas desempenham uma função muito importante na proteção contra o risco de erosão do solo, por exemplo.

A utilização de leguminosas nos sistemas de cultivo proporciona uma melhoria de vários aspetos na fertilidade do solo e disponibilidade de nutrientes. Mais especificamente, o uso de ervilha em solos arenosos resulta numa acumulação no teor de carbono orgânico após a colheita de 7,58 g kg -1, enquanto com o cultivo de aveia o valor obtido foi de 7,21 g kg -1.

Mais ainda, comparando a produção de trigo em monocultura com a introdução de leguminosas-grão no sistema cultural, há um aumento no rendimento da cultura de cereal de 1,2 ton/ha. Esta inclusão de leguminosas num sistema de rotação de culturas, resulta também no aumento da absorção de azoto, por exemplo, entre 23-59% na rotação ervilha-trigo e 61% na rotação ervilhaca-cevada.

Quanto à consociação de leguminosas com outras culturas, e tendo como comparação o cultivo em monocultura, há um aumento de rendimento total de 65 e 71% num sistema de 1 e 2 linhas de milho, respetivamente, quando alternado com 3 linhas de soja.

A consociação de trigo com grão-de-bico com um espaçamento de 20 cm, contribuiu também para o controlo da população de plantas infestantes, nomeadamente para a redução da população de plantas infestantes em cerca de 70% quando comparado com o cultivo em monocultura.

Principais conclusões

  • A adoção de leguminosas nos sistemas culturais não depende apenas do efeito das escolhas dos agricultores, mas estes desempenham um papel central para essa decisão.
  • A formulação de políticas agrícolas que apoiem e que se responsabilizem por criar estratégias eficazes para a integração destas culturas é um fator prioritário.
  • Muito devido à crescente procura por fontes de proteína de origem vegetal e práticas agrícolas mais sustentáveis, as leguminosas-grão têm um papel importante na mudança dos sistemas culturais futuros.
  • É necessário investir na seleção de espécies e cultivares adaptadas a diferentes sistemas de cultivo e condições edafo-climáticas, por forma a garantir a produtividade e o rendimento das culturas.